Você sabe qual a diferença entre valor RMS e True RMS?

Você sabe qual a diferença entre valor RMS e True RMS?

Para entender qual a diferença entre valor RMS e True RMS parece óbvio que é preciso que você entenda primeiro o que é valor RMS.

O termo “true” significa verdadeiro, então será existe um RMS de mentirinha e outro “verdadeiro”, é isso?

A sigla RMS significa Root Mean Square que “em bom português” quer dizer Raiz Média Quadrática também denominado de Valor Eficaz.

Hum! Isto está cheirando a matemática! Então, vamos a ela, sem medo de ser feliz.

Antes de tudo que tal destrincharmos cada uma destas palavras separadamente para tentar entender o que significam juntas.

Comecemos com “raiz” e “quadrática”.

Por exemplo, dois elevado ao quadrado é igual quatro (22 = 4). Encontrar ou “extrair a raiz quadrada de 4” é descobrir qual o número que elevado ao quadrado dá 4 que neste exemplo nós sabemos que é 2.

Então qual é a raiz quadrada de 25? Ora, é o número que elevado ao quadrado dá 25 e “o prêmio vai para…. o número 5”.

Depois desta breve revisão sobre raiz quadrada, para acordar seus neurônios dorminhocos, falemos das médias (que neste caso não é de café com leite).

Em matemática podemos calcular diversos tipos de média e mais comum de todas é a média aritmética que embora não seja de interesse em nosso “estudo” sobre RMS irei abordá-la não só como curiosidade, mas também para ajudar a compreender o que vem pela frente.

Média aritmética: uma revisão rápida

Suponhamos que numa determinada escola para o aluno passar de ano tenha que obter média aritmética 7 em quatro avaliações. Assim, ele terá que somar 28 pontos nas quatro avaliações porque 28 dividido por 4 é igual a 7, logo se ele tirou 4 na primeira prova, 6 na segunda, 9 na terceira até aqui só somou 19 pontos, então ele vai ter que se virar para tirar 9 na quarta avaliação.

Vai ter que estudar muito (se precisar de aula particular fala comigo kkkk)!

E a média quadrática, como é que fica?

Esta é um pouquinho mais sofisticada e menos usada no dia-a-dia, mas muito importante quando falamos de tensões e correntes alternadas que é o nosso caso.

Por definição

Média quadrática-min
Parece confuso, mas não é. Vamos a um exemplo numérico.

Usando as notas do aluno vadio teremos primeiro que fazer a média aritmética dos quadrados dos quatro números, ou seja, (42+62+92+92)/4= 214/4 = 53,5.

Se quiséssemos achar a Raiz Média Quadrática teríamos que extrair a raiz quadrada de 53,5 que dá aproximadamente 7,314 (a conta foi feita com calculadora).

Mas qual seria o interesse de se extrair a raiz da média quadrática?

No caso das notas nenhum, mas na medida de tensões e correntes alternadas é muito importante, como veremos.

Deixemos este assunto das médias temporariamente de lado e passemos a algumas considerações sobre a nossa corrente/tensão alternada.

Como medir uma tensão ou corrente alternada?

Medir uma corrente ou tensão alternada não é uma tarefa fácil uma vez que seus valores variam continuamente ao longo do tempo e um instrumento analógico (aquele de ponteiro) não conseguiria acompanhar estas variações.

Nosso estudo se prenderá, inicialmente, as formas de onda senoidais que são as da tensão das nossas tomadas e por isso, nos interessam mais.

Onda senoidal

Já que não se tinha uma maneira fácil de medir todos os valores de uma tensão alternada (senoidal, por exemplo) alguém teve a ideia de fazer a comparação entre o efeito térmico que uma corrente contínua e uma alternada senoidal pura apresentaria quando aplicadas (uma de cada vez, é claro) a uma carga resistiva.

 

 

 

Potência dissipada numa carga resistiva

A experiência

Suponhamos a seguinte experiência.

Alimentamos uma resistência R de 100Ω com uma tensão continua igual a 200V durante 1 hora, por exemplo.

 

Carga resistiva com alimentação AC e DC

Pela Lei de Ohm sabemos que a corrente no circuito será 2A e a potência P dissipada que é dada em watts será calculada por P = RxI2 = 100×22 = 400W.

Aqui surge uma dúvida, e se em vez de uma corrente continua aplicássemos uma alternada qual valor que deveríamos usar para obter a mesma temperatura, ou dissipar os mesmos 400W, depois do mesmo tempo?

Seria 100V também? Mas que “100V” é este, o valor de pico da senóide?

Ocorre que este valor de pico, tanto positivo como negativo, só está presente duas vezes em cada ciclo.

Poderíamos então pensar num valor que correspondesse a uma média aritmética dos valores da senóide.

Mas esta média daria zero já que a média aritmética do semiciclo negativo anularia a média do semiciclo positivo.

Usamos então um artifício. Fazemos uma retificação de meia onda, calcularmos a média aritmética do semiciclo positivo e depois multiplicamos o resultado por dois.

Em outras palavras, uma retificação de onda completa.

O valor médio de uma senóide retificada em meia onda

Comecemos calculando o valor médio de uma senóide retificada em meia onda.

 

Retificação de,meia onda

Par encontrar o valor médio, neste caso, também chamado de valor DC, precisaremos somar todos os valores de tensão do semiciclo e dividir pela quantidade de valores.

Usando um pouquinho a sua imaginação você concluirá que ao somar todos os valores de tensão neste semiciclo da senóide você estará calculando a área sob o semiciclo da senóide.Calculando o valor médio de uma retificação de meia onda

O cálculo desta área exige o uso de uma “ferramenta” matemática chamada cálculo diferencial e integral que não será feito aqui para não correr o risco de fazê-lo abandonar a leitura, mas juro, por tudo que há de mais sagrado, que esta área dá um valor igual 2 vezes Vpico.

Agora precisamos dividir esta área pelo número de valores que vai de 0 até 2Π, ou seja, um ciclo completo.

Esta continha nos dará o valor médio do semiciclo da senóide.

Vamos a ela: 2Vpico/2π= 1/π Vpico = 0,318 Vpico.

Você não precisa lembrar-se destas contas, mas não pode esquecer-se do resultado final.

Fórmula do Valor médio meia onda-min

Agora fica fácil concluir que o valor médio de uma retificação de onda completa será o dobro deste valor.

Fórmula do Valor médio Onda completa-min

O que nós estávamos querendo saber mesmo?

Depois de todas estas contas e explicações é possível que você já nem lembre mais o que estávamos querendo saber.

Vou reativar sua memória: nós queríamos saber se o valor médio de uma senóide (completa) produziria a mesma potência que uma tensão continua.

Vamos fazer as contas e chegar a conclusão (que não).

Na nossa experiência vimos que para 200VDC em 100Ω obtivemos P = 400W.

Se a senóide tiver um valor de pico também de 200V obteremos uma corrente média igual a
I = 0,636×200/100 = 1,272A o que dará P = 100 x (1,272)2 = 161,79W, ou seja, um valor bem menor que 400W.

Daí pode-se concluir que para obter a mesma potência precisaremos ter uma senóide com valor de pico bem maior. Mas quanto será este valor “bem maior”?

E assim nasceu o valor RMS

Que tal experimentarmos a média quadrática em vez da média aritmética?

Para fazer a média quadrática precisamos primeiro elevar a nossa “querida” senóide ao quadrado e depois de fazer a média aritmética destes valores extrair a raiz quadrada do resultado.

Novamente vou ter que jurar que ao fazer estas contas encontraremos o valor mostrado a seguir.

Valor RMS-minSe você não confia em mim e quiser ver todas as contas tim por tim então clique neste link e seja feliz.

Entretanto, é preciso que fique bem claro que estes, fatores (0,7 e 1,41) só valem para senóides “bem comportadas”, aquelas que, em geral, só existem nas páginas dos livros.

Como “enganar” um voltímetro analógico

Como eu disse no início o voltímetro analógico não tem como medir a tensão RMS, o que podemos fazer é uma retificação de onda completa e medir o valor médio.

(Abra o seu analógico e você encontrará os dois diodos lá dentro numa configuração parecida com a da figura abaixo).

 

Circuito para medir tensão AC em multímetro analógico

Nunca é demais lembrar que valor médio e valor RMS são diferentes, mas podemos relacionar os dois da seguinte maneira:

                 Vmédio = 0,636 Vpico ou Vpico = Vmédio/0,636

                 VRMS  =  0,7 Vpico     ou Vpico = VRMS/0,7

Logo Vmédio/0,636 = VRMS/0,7 ou

                   VRMS = (0,7/0,636) Vmédio =1,11 Vmédio.

Então, o voltímetro na verdade o analógico mede o valor médio de uma senóide retificada em onda completa, mas o painel é calibrado com uma escala 1,1 vezes maior que o valor medido, ou seja, é um valor RMS “de mentirinha”.

Esta mentirinha é quase uma verdade se a senóide for bem “bonitinha”, isto é, sem harmônicos.

A relação entre o valor RMS e o valor médio é denominada FATOR DE FORMA e pode ser muito útil para determinarmos o valor RMS para outras formas de ondas “bem comportadas” e que não sejam senoidais, tais como ondas triangulares ou quadradas. No caso particular da senóide o fator de forma é 1,11 como acabamos de calcular. Voltaremos a isto mais a frente.

Finalmente o TRUE-RMS

Com a chegada dos voltímetros digitais e com chips conversores A/D capazes de tomar um grande número de amostragens, bem como incluindo algoritmos matemáticos poderosos para fazer aquelas contas do cálculo diferencial e integral tornou-se possível fabricar multímetros capazes de medir ondas mesmo não senoidais puras e expressar no display o valor “verdadeiro” da tensão RMS.

Por que é importante o True-RMS

Para o técnico de eletrônica não é muito importante, em geral, a diferença apresentada por um voltímetro RMS “de mentirinha” e um TRUE-RMS, entretanto para o eletricista a diferença de leituras pode ser crucial para identificar defeitos “estranhos” numa rede elétrica provocados por harmônicos oriundos de cargas reativas ou dispositivos eletrônicos com SCR ou TRIAC.

Portanto, se você é eletricista (ou pretende ser) e vai comprar um amperímetro alicate a melhor opção é, sem dúvida, um modelo TRUE-RMS.

O valor RMS de uma onda triangular

O cálculo da tensão RMS não se aplica apenas a tensões e correntes senoidais, embora isto seja o mais comum.

Há que se ficar atento, entretanto para o fato de que o fator 1,41 (conhecido como fator de crista) apresentado acima aplica-se exclusivamente a ondas senoidais puras.

Suponhamos que queiramos calcular o valor RMS de uma onda triangular como a mostrada abaixo.

Mais uma vez não apresentarei os cálculos, pelas razões já expostas, entretanto o que importa é você saber que no caso de uma onda triangular periódica o valor RMS será obtido multiplicando-se o valor de pico por 0,557 ou que o fator de forma neste caso é 1,154.

Fator de Crista e Fator de Forma

Finalmente talvez valha a pena encerrar este post com duas fórmulas que podem ser útil principalmente para quem está estudando para concursos.

E para arrematar aviso que os concurseiros de plantão devem memorizar a tabela abaixo e boa sorte.Quem estiver interessado na matemática avançada para o cálculo de RMS CLIQUE AQUI.

5/5 - (1 voto)

Paulo Brites

Técnico em eletrônica formado em 1968 pela Escola Técnica de Ciências Eletrônicas, professor de matemática formado pela UFF/CEDERJ com especialização em física. Atualmente aposentado atuando como técnico free lance em restauração de aparelhos antigos, escrevendo e-books e artigos técnicos e dando aula particular de matemática e física.

Website: http://paulobrites.com.br

18 Comentários

  1. Rodrigo Venancio

    Prezado Paulo, gostei do artigo, tem muito professor por aí que complica e não explica.

    Um detalhe, isso não muda em nada o conteúdo do seu artigo mas no texto abaixo:

    Usando as notas do aluno vadio teremos primeiro que fazer a média aritmética dos quadrados dos quatro números, ou seja, (42+62+92+92)/4= 214/4 = 53,5. Acredito que seja ( 16+36+81+81)/4= 214/4. Abs.

  2. Eddi Martins

    Caro José Mario
    Não sou eletricista nem técnico de eletrónica, mas a sua explicação sobre a diferença entre RMS e True RMS é brilhante… até eu percebi a diferença.
    Os meus parabéns pela forma simples e clara como escreveu a explicação, só possível de alguém com muito conhecimento e dom…
    Obrigado

    • Paulo Brites

      Olá Eddi, ficou confuso com seu comentário Eu não sou José Mario sou Paulo Brites. O comentário era para mim ou para outra pessoa?

  3. Ivo Soares da silva

    Professor, tenho um alicate amperimetro digital que nele está apenas “RMS” como sendo digital posso considerar como TRUE RMS?

    • Paulo Brites

      Uma coisa não tem nada a ver com a outra. Todo instrumento analógico ou digital mede sempre ac senoidal RMS
      Analógicos nunca são true RMS.
      Digitais podem ou não ser true RMS Tem que ver o que manual diz, mas como ele não enfatiza o termo TRUE RMS eu acredito que não seja TRUE.

  4. Juan

    Obrigado, as informações foram muito boas para tirar minhas duvidas, e hoje que estamos trabalhando com geração de energia utilizando placas fotovoltaicas não podemos trabalhar sem um multimetro com essas funções.

    • Paulo Brites

      Que bom Juan, fico feliz em teer ajudado.
      Existem muitos mitos e confusões em termos de eletricidade tenho tentado divulgar e esclarecer sobre estes temas
      Compartilhe com seus colegas.

  5. Adriano Gonçalves

    Olá, professor Brites

    É muito agradável a leitura de seus artigos e este foi muito esclarecedor mesmo sendo um assunto bem complicado de explicar.

    Parabéns!

    Talvez o professor possa verificar e confirmar se na última tabela (formas de ondas e seus valores de fator de crista, fator de forma e valor médio) no caso da onda triangular acredito que o valor médio seja Vpico / 2. Verifiquei que outro leitor já fez este apontamento. Mas para que eu tenha certeza se estou entendendo de forma correta, pergunto: uma onda triangular com pico de 10V teria um valor médio (VDC) igual a 5V e este seria o valor medido com um multímetro na opção VDC ?

    Até onde entendo, os multímetros não medem tensões de pico. Medem tensão RMS (VAC) e tensão média (VDC), correto? Se precisarmos da tensão de pico temos que calculá-la, utilizando os fatores acima, a partir das medições VRMS ou VDC feitas no multímetro, conforme o caso se a tensão é alternada (VRMS – tensão eficaz) ou tensão contínua (VDC – tensão média).

    Favor verificar se estou enganado.

    E mais uma vez, obrigado por seus excelentes artigos.

    • Paulo Brites

      Você tem razão, na útima figura saiu 2Vp. Olhando a figura colorida accina verá que está correto.
      Eu vou retrabalhar este artigo incluindo algumas práticas em video porque alguns alunos do Clube tievera dúvidas sobre este assunto.
      É bom ter leitores atentos para ajudar a minha EUquioe (isso mesmo EU rssrs) na revisão.
      Abraços e obrigado pelo apoio

  6. Gustavo Furlan

    Olá, Prof. Paulo.

    Parabéns pelo excelente trabalho de ensino.

    Apenas para contribuir com o artigo, há uma informação incorreta na última figura que apresenta os valores do fator de crista, fator de forma e valor médio para as formas de onda senoidal, quadrada e triangular.
    Em relação à onda triangular, o valor médio está expresso como sendo igual a “2.Vp”, quando, na realidade, o correto é “Vp/2”.

    Parabéns mais uma vez pelo empenho e dedicação na disseminação do conhecimento teórico e prático em eletricidade e eletrônica, sempre com conteúdos de excelente qualidade.

    • Paulo Brites

      Gosto muito quando meus leitores fazem o dever de casa lendo com atenção e pegam alguns “gatos” escondidos sorrateiramente no texto como dizíamos lá na Revista Antena.
      Se bem entendi, você está se referindo ao que aparece na última figura. Vou providenciar uma correção da mesma.
      Muito obrigado por ajudar a salvar minha reputação (rsrsrs) caçando este bichano.

  7. Ronaldo

    Prof. Paulo Brites,

    Cliquei no link para ver o desenvolvimento matemático da fórmula mas aparece a seguinte mensagem de erro:

    “Não conseguimos conectar com o servidor em http://www.elt09.unifei.edu.br.”

    O Sr. poderia verificar o que está acontecendo ?

    • Paulo Brites

      Olá Ronaldo, obrigado por me avisar A página deve ter sido tirada do ar, mas já corrigi. Coloquei o link com o PDF do meu computador.
      Eu não analisei o trabalhoso minuciosamente, mas considerando que foi escrito por alguém da FEI eu confio. Qualquer dúvida me avisa.

  8. Cleisson

    Bom dia Paulo.

    A fórmula do Fator de Forma está incorreta (está invertida). O correto seria:

    Fator de Forma = Vrms/Vdc

    Qualquer dúvida, consulte o próprio PDF que o senhor recomendou no final do artigo e compare as duas.

    Obrigado.

    • paulobrites

      Muito obrigado Cleisson Fico contente quando um leitor caça um gato como esse. É sinal que está lendo com cuidado. Já coloquei uma observação no post.
      Uma abraço.

      7

  9. José mário

    Bom dia Paulo, muito bom os seus artigos.
    Por gentileza, peço que utilize os sinais adequados nos seus cálculos (_+*/) nos seus cálculos para melhor compreensão. Peço que reveja o cálculo da potência obtida com a tensão RMS, penso que está incorreto (favor, me corrija e me explique caso eu esteja errado)

    transcrição:
    ” I = 0,636×200/100 = 1,272A o que dará P = 100 x (1,272)2 = 161,79W, ou seja, um valor bem menor que 400W. ”
    Grande abraço

    • paulobrites

      Caro José Mario
      Muito obrigado pela sua participação, para mim é muito importante os comentários dos leitores.
      Com relação aos sinais é um problema do editor de texto do wordpress, mas vou tentar uma solução para melhorar isso. Quanto a sua dúvida eu não entendi onde você viu o erro nos cálculos, por favor me esclareça melhor. No pedaço de sua transcrição as contas estão certas. Se preferir entre em contato comigo pelo email contato@ac14008-04537.agiuscloud.net para tentarmos esclarecer a dúvida.
      Abraços
      Paulo Brites

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