E Deus disse “façam-se os bits” e assim surgiu a Eletrônica Digital!

Parte VI – As famílias lógicas

Neste post vou abordar questões mais práticas da Eletrônica Digital, ou seja, aquilo que você irá encontrar nos circuitos que está reparando.

Antes, porém cabem alguns comentários. Quando comecei esta série a intenção era dar apenas as noções básicas.

Acontece que uma coisa puxa a outra e já estamos na parte VI.

Daqui pra frente e por um tempo eu vou tratar da Eletrônica Digital apenas nos posts das quartas-feiras para que o blog não fique parado num assunto só. Aos sábados volto apresentar assuntos diversos sobre eletricidade e eletrônica como vinha fazendo.

Como já citei anteriormente uma das vantagens da Eletrônica Digital sobre a Analógica é que não precisamos lidar com os circuitos em nível de componentes discretos e sim, apenas em blocos com entradas e saídas.

O que são famílias lógicas?

Estes blocos, no entanto são constituídos internamente por resistores, diodos e transistores e passaram a receber o nome de “famílias lógicas” de acordo com a maneira como são constituídos.

Estas famílias são designadas pelas iniciais dos componentes que as constituem.

Por exemplo, nos posts anteriormente foram apresentadas duas portas lógicas (AND e OR) construídas a partir de diodos. Esta foi a primeira família lógica chamada de DL (Diode Logic). A DL está obsoleta e não se fabricam mais CIs com esta estrutura o que não impede que encontremos um circuito lógico em algum equipamento construído com diodos discretamente.

Aqui talvez caiba uma observação. Quando se começa a estudar eletrônica o primeiro componente que nos é apresentado é o diodo e o primeiro circuito é o retificador de meia onda que é feito com o diodo.

Isto pode passar para o futuro técnico a ideia falsa de que diodos só servem para fazer circuitos retificadores. Nada disso, diodos são chaves eletrônicas e, portanto podem ter outras funções diferentes da retificação como foi mostrado nas portas AND e OR.

À medida que os fabricantes foram melhorando as técnicas de fabricação de circuitos integrados outras famílias surgiram como a RTL (Resistor Transistor Logic) e DTL (Diode Transistor Logic). Estas famílias estão completamente obsoletas e não se encontram em mais nenhum circuito, por isso não irei abordar tratar delas.

Uma porta AND TTL por dentro

Uma porta NAND TTL por dentro

Em 1962 a Texas Instruments introduziu no mercado a família TTLTransistor Transistor Logic. Os TTLs formaram um divisor de águas na Eletrônica Digital.

A partir deles milhares de projetos digitais surgiram. Foi uma “febre”.

Uma das principais características dos TTLs  era a entrada constituída por transistores bipolares com dois ou mais emissores como vemos na figura onde temos a representação interna do circuito de uma porta NAND de duas entradas.

Você deve ter se ajustado olhando o circuito e pensado:- que coisa complexa.

Calma! Não precisamos entende-lo. Ele está embutido dentro de um circuito integrado. Basta saber o que cada pino faz e pronto.

Uma característica importante da família TTL é a padronização de 5V como tensão de alimentação para todos os circuito integrados da família.

A Texas criou dois grupos de integrados cuja nomenclatura começa com 74 ou 54.

Os CIs de prefixo 54 são de aplicações militares e não serão abordados aqui.

Mais tarde diversos fabricantes passaram a produzir circuitos integrados digitais da família TTL similares aos da Texas.

Antes de prosseguir, uma perguntinha. Percebeu porque todos os equipamentos eletrônicos possuem uma fonte de 5V?

E na prática como fica?

Você deve estar achando estranho que tenha sido apresentado o circuito acima uma vez que foi dito que uma das principais vantagens de lidar com a Eletrônica Digital e não precisar se preocupar com os componentes discretos.

E isso continua a ser verdade. O circuito foi apresentado como curiosidade, mas daqui pra frente iremos nos preocupar apenas com a forma correta de polarizarmos o CI e com os valores de tensão que serão interpretados como bits, ou melhor, os níveis lógicos nas entradas e saidas.

Mais sobre a família TTL

Esta “família” de circuitos integrados digitais “reinou” absoluta por muitos anos e centenas de portas lógicas foram construídas com este tipo de tecnologia que se baseia nos transistores bipolares. Embora, hoje em dia não se façam mais projetos utilizando estes CIs, a sua “penetração” na Eletrônica Digital foi tão forte que os seus parâmetros passaram a ser o que se chama de padrão TTL.

Uma das desvantagens dos primitivos CIs da família TTL era excessivo consumo de corrente.

Com a evolução da fabricação dos semicondutores a tecnologia MOS – Metal Oxide Semiconductor passou a dominar e outra família de CIs digitais surgiu: – a família CMOS sobre a qual falaremos no próximo post.

O que é o padrão TTL?

Todos os circuitos integrados que operam de acordo com a  tecnologia  do padrão TTL  são alimentados com 5V sendo permitida uma tolerância de +/- 5% nesta tensão, ou seja, eles precisam receber entre 4,75 e 5,25V para funcionarem corretamente.

Veja o post sobre multímetros

Será que você percebeu agora a importância de medir corretamente a tensão da fonte de 5V do aparelho que você está reparando?

Outra questão importantíssima para a qual o técnico reparador precisa estar atento são os níveis de tensão que o padrão TTL aceita como níveis lógicos 1 e 0.

Você já aprendeu que os chamados bits representados pelo binários 1 e 0 só existem do ponto de vista teórico da álgebra de Boole, mas na prática o circuito trabalha com tensões e não com bits.

Para o projetista que está desenvolvendo a lógica do seu circuito é muito mais fácil trabalhar com bits. Cabe, porém a quem vai transformar este projeto em realidade saber quais os níveis de tensão que seus componentes irão interpretar como tais bits.

Já o reparador precisa saber quais são estas tensões para que possa identificar se o circuito está funcionando corretamente ou não.

No caso do padrão TTL que estamos estudando neste post estes níveis são os seguintes:

– valores de tensão de entrada entre 0 e 0,8V são interpretados como nível lógico 0 (low).

– valores de tensão de entrada entre 2 e 5V são interpretados como nível lógico 1(high).

– valores de tensão de saída entre 0,3 e 0,5V são interpretados como nível lógico 0(low).

– valores de tensão de saída entre 2,4 e 5V são interpretados como nível lógico 1(high).

– valores intermediários são considerados indeterminados e podem provocar instabilidade no circuito (isto pode ser a causa do conhecido “defeito intermitente”).

Veja o resumo nos gráficos abaixo.

Níveis lógicos de entrada do padrão TTL

Níveis lógicos de entrada do padrão TTL

Níveis lógicos de saída do padrão TTL

Aplicando os conceitos de Eletrônica Digital na reparação

A maioria dos livros de Eletrônica Digital (ou todos) se perde em considerações teóricas vazias e transformam um livro de eletrônica em livro de matemática. O estudante “aprende” a fazer um monte de contas com binários, resolver estruturas lógicas com mapa de Karnaugh, mas quando olha para um circuito de verdade fica igual aquele animal olhando para o palácio.

Meu foco principal nesta série de artigos não é o projetista e sim o reparador, embora tudo que foi e será abordado seja extremamente útil para quem pretende desenvolver um projeto digital.

Uma das queixas dos técnicos reparadores é a falta da indicação das tensões no esquema (quando tem esquema).

Se estamos lidando com circuitos digitais estas tensões não são constantes como nos circuitos analógicos. O nível lógico, além de depender do padrão usado, dependerá do que está sendo executado.

Uma das melhores maneiras de fazer “medidas” nestes circuitos, excetuando-se as tensões de alimentação, não é com o multímetro e sim com uma ponta lógica (logic probe).

Alguns multímetros digitais incorporam esta função que pode ser muito útil na reparação.

Brevemente irei abordar e mostrar como podemos construir e usar uma ponta lógica. Aguarde, por ora fico por aqui.

Até sempre.

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Paulo Brites

Técnico em eletrônica formado em 1968 pela Escola Técnica de Ciências Eletrônicas, professor de matemática formado pela UFF/CEDERJ com especialização em física. Atualmente aposentado atuando como técnico free lance em restauração de aparelhos antigos, escrevendo e-books e artigos técnicos e dando aula particular de matemática e física.

Website: http://paulobrites.com.br

4 Comentários

  1. olá, o circuito do “AND TTL” está errado, aquele é um NAND TTL e a saída deveria estar depois do diodo, para que a máxima saída em LOW seja menor que 0,8 V.

    • Paulo Brites

      Olá Fernando adoro quando encontro leitores atentos e “caçam gatos” nos meus posts, é sinal que tem gente lendo de verdade. Já corrigi lá no texto e este bichano digital merece ir para a seção “Caçando Gatos”. Um Forte abraço.

  2. sou a angela da animaçao infantil da maris e barros to admirada com seu progresso. adorei seu site. as vezes penso em
    voce e agradeço a deus te-lo conhecido, gente boa. desejo muitas felicidades a voce.

    • paulobrites

      Valeu Angela
      Bons tempos aqueles, mas a fila anda e quem vive de passado é museu.
      Boas as nossas parcerias, às vezes, tenho saudades.
      Obrigado precisamos nos encontrar um dia e colocar as fofocas em dia.

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